top of page

LIVRO: AQUI DENTRO

Páginas de uma memória: CARANDIRU

Este livro é muito indicado para quem gostaria de conhecer e saber mais detalhes de como era a vida dentro do complexo Carandiru. Nele, encontramos muitos depoimentos dos presidiários, contando muitos detalhes do seu que dia-a-dia. Indicamos para enriquecer conhecimento, você irá se surpreender !

458aaaf2-5ade-4c97-ba26-f50a5a38e9ed.jpg
CURIOSIDADES: About

CONFIRA AQUI ALGUNS DEPOIMENTOS DESTE LIVRO

João das coxinhas

João – Na detenção tinha uma grande cozinha onde os presos cozinhavam, era no pavilhão 6. Eu trabalhava lá, fazia arroz, feijão, sopa, era muita fartura, graças a Deus. Tinha abundância: legumes, verduras, até mesmo guloseimas que a gente chama aqui de pudim, e também canjica, serviam pra nós. Tinha leite para os detentos doentes, era bem melhor, era mais saudável. Agora com esse negócio de bandeco, não sei como é que está.

Agora você faz as coxinhas aqui dentro João?

João – É, a gente não pode passar fome, né?, porque o bandeco não dá comer. A gente faz, senão vai ter que comer o bandeco.

Quantas você vende por dia?

João – Mais ou menos cem. Eu trabalho sozinho, né? É agora que estou começando a me aperfeiçoar melhor. Tem um rapaz no segundo andar que vai abrir uma lanchonete. Vai ser um ponto de venda e eu vou vender coxinhas pra ele.

Você aprendeu aqui dentro?

João – Eu tinha um pouco de noção, né? Minha mãe sempre trabalhava com culinária e eu sempre trabalhei na rua, já fui garçom, sempre gostei de culinária. Então, aqui dentro, eu aperfeiçoei como fazer a massa, que também tem segredo, e os recheios também, né? Tem que ter muita higiene, muito carinho, porque os demais não gostam que seja assim, de qualquer jeito. Mando vir da rua os ingredientes, o queijo e o presunto que eu preciso. Eles estão permitindo entrar farinha e ovos novamente, e estamos fazendo uma campanha para que possam nos ajudar pra que cada um possa fazer um tipo de culinária, tem irmão fazendo cocada e doce de leite, por exemplo. O que ta difícil é a mercadoria, mas ta melhorando, já colocaram uma placa, lá embaixo, dizendo que vai poder entrar ovos, farinha de trigo e leite em pó – que a gente usa muito – e outras misturas mais.

CURIOSIDADES: Welcome

Roberta

Há quanto tempo você está aqui Roberta?

Roberta – Eu, quatro anos, Sophia.

Como foi esse tempo aqui?

Roberta – Ah! Foi terrível, mas aprendi muitas coisas, né? Coisas boas e coisas ruins. Mas eu, daqui, só quero guardar as coisas boas que aprendi. As pessoas que a gente conhece, que a gente faz amizade sincera, tá entendendo?

Foi a primeira vez que você ficou presa?

Roberta – A minha primeira experiência, primeira e ultima. Eu trabalhava na rua, fazia programa, e trabalhava registrada num restaurante de cozinheira.

E amigos? Você se dá melhor com os ladrões ou as meninas como você?

Roberta – Olha, geralmente a gente se dá bem com os dois. Porque tanto tem ladrão que a gente faz amizade sincera como tem bicha também. Tem ladrão que a gente senta, conversa, expressa nossos problemas, conversa com eles...

Eu sinto que você amadureceu, sabia?

Roberta – Amadureci muito, aprendi um monte de coisas, com certeza.

Você está mais assentada?

Roberta – Porque eu acho que no começo da cadeia a gente fica meio perdida.

Naquela época você era mais deslumbrada. Agora não.

Roberta – Realmente. É tudo uma fase que a gente passa aqui dentro, né? A gente chega, ás vezes a gente se empolga, vê os acontecimentos, então fica assanhada, extrovertida demais. Mas depois a gente fica mais sossegada. Pra gente não é mais novidade, tá entendendo? Aí, se torna rotina do dia-a-dia, normal. Como tem muitas bichas que continuam se prostituindo. Eu não, eu fui uma bicha que passei todas as fases que podia passar aqui dentro, mas nunca fiz uma prostituição, assim, coisa reta, como as bichas dependem pra sobreviver. Nunca precisei. Eu fui uma bicha que cheguei e casei, tive meu marido, respeitei muito ele, fiquei muito tempo com ele, mas depois ele foi embora, fiquei solteira. Depois casei de novo e foi assim, ficando. Então nunca dependi da prostituição.

E você lava, passa, trabalha, porque?

Roberta – Eu faço porque distrai a minha mente. Em vez de ta fazendo qualquer coisa, a gente ta lavando uma roupa. Distrai a mente da gente, o dia passa mais rápido.

Qual seu primeiro projeto quando chegar na rua?

Roberta – Nossa! São tantos, viu?, que nem sei qual vai ser a emoção quando eu estiver saindo daqui.

Hoje, você ta meio perdida...

Roberta – A gente fica. A gente ta a tanto tempo presa, aqui dentro, que eu sempre perguntava pra Lulu: “Quando a gente sair lá fora, como será que o pessoal vai ser a gente? Como a gente vai enfrentar o pessoal?”. Porque é sempre a mesma coisa, né, Sophia? Viado onde passa, uns mexem, uns respeitam. Qual será nossa reação quando sair daqui? Não sei, fico meio assim pensando: “vou pegar um metrô, ônibus, com tanta gente né?”, aquela coisa, a gente fica sem saber, fica meio perdido, né?

A imagem que a gente lembra de você é quando fez aquele desfile. Você fez o maior sucesso!

Roberta – Adorei! Foi um momento muito bom que eu passei aqui dentro, fazendo aquele desfile. Foi legal, realmente.

CURIOSIDADES: Welcome
bottom of page